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(primeira parte aqui, segunda parte aqui)
Chegados ao recobro, volta a analgesista e diz-me: pronto, agora vamos então por o cateter da epidural. Toda eu era confusão, e por momentos duvidei da minha sanidade mental. Explicaram-me então que antes do parto não tinham conseguido dar a epidural porque tinha "entrado em vaso". Para não atrasar a cirurgia, foi-me dada uma raquianestesia. Adorava explicar-vos mais sobre este assunto mas poderia estar a dizer grandes asneiras. Correu tudo bem, apesar de nunca ter perdido a sensibilidade nas pernas não senti qualquer dor, e chegamos então ao ponto, após o parto, em que me foi colocado o cateter epidural - não sem antes me terem dado uma qualquer droga que me fez sentir bêbada, e furado mais duas vezes as costas. Nos dois dias que se seguiram, foi por aí que me injectaram a medicação abençoada que me fez sentir novamente uma pessoa.
Então e o bebé?
Estava com o pai, naquele que foi o seu primeiro colinho. Quando eu estava, finalmente, devidamente drogada e estabilizada, a parteira veio pô-lo à mama. Falarei mais sobre amamentação depois, mas para já, conto-vos que não foi mágico, não foi espectacular, nem sequer foi doloroso - isso viria a ser depois - foi só estranho. Mamou um pouco, e adormeceu, acho. Nesta altura em que escrevo as memórias já começam a ficar ligeiramente confusas. Ficamos ali, os três, inebriados pelo momento. Acho que foi a última vez que me senti incondicionalmente feliz, sem medos.
Penso que passaram horas, mas não sei quantas. Acho que estávamos no inicio da tarde quando me disseram que iria para o quarto, mas nem sei. A pediatra comentou comigo que tinha imensa gente à minha espera no quarto. Achei que ela estaria a exagerar e perguntei quanto era imensa gente, ao que ela me respondeu: umas sete pessoas. E estavam. Sete pessoas à minha espera, depois do parto.
Quando pesamos os prós e os contras de um parto no público vs. privado, esta questão das visitas foi imediatamente para a coluna dos contras. No privado não há limite de visitas, quase tudo é permitido, e isso nunca foi visto com bons olhos por nós. Nem sonhávamos o impacto que este factor teria no pós parto. É claro que apreciamos o carinho de todos. E no início nem nos apercebíamos do quão cansados estavamos, até começar a pesar.
Ao longo dos 4 dias em que estive internada, nunca estivemos sozinhos durante o dia. As visitas vinham e ficavam, nem que estivessem já 5 pessoas no quarto. À boa maneira portuguesa: cabe sempre mais um, e iam ficando, às vezes por horas. Entretanto todos queriam pegar no bebé, falava-se alto, deixava-se aberta a porta que fazia corrente de ar. Entre sacos e embrulhos, flores, balões, duas camas, um berço, um cadeirão, e todas as visitas, aquele quarto começou a sufocar-me. Na segunda noite, fritei.
Comecei a ter dores, e a medicação de 4 em 4 horas já não estava a ajudar o tempo todo. O enfermeiro de serviço demorou, porque havia uma outra mãe a precisar de assistência. Não tinha a certeza de que estivesse a fazer um bom trabalho com a amamentação: tinha os mamilos em sangue e o miúdo não urinava desde a noite anterior. Não tinha pregado olho o dia todo, e o cansaço começava a abater-se sobre mim. Entrei em desespero.
Quando o enfermeiro chegou, eu chorava que nem um bebé.
Sentou-se comigo e falamos. Pediu que lhe explicasse o que me atormentava. E uma por uma, fomos desmontando todas as minhas dúvidas e incertezas. A sensação de medo e desespero ainda está tão presente que me custa sequer pensar nessa noite. No dia seguinte, vi-me forçada a pedir ajuda para limitar as visitas. Tirei o som ao telemóvel, deixei de responder a mensagens, pedi que não viessem ao hospital. Ainda assim nem toda a gente respeitou, e continuamos a ter visitas non-stop até ao ultimo minuto que lá passamos. Literalmente - houve um grupo de familiares que insistiu para nos vir ver ao hospital na tarde em que iríamos para casa. Mesmo eu tendo pedido para não virem, fui ignorada e lá apareceram.
Quando, no primeiro dia, me disseram que teria que ficar quatro dias internada, não fiquei agradada com a ideia. Queria ir para casa e começar a nossa vida a três o mais rapidamente possível. Mas confesso que, à medida que o tempo foi passando, comecei a stressar com a ideia de deixar o hospital. É tão fácil estar internada: temos uma campainha na cama e enfermeiros especializados à distância de um toque. Qualquer dúvida é prontamente esclarecida, e a rede de segurança está sempre ali. Mas em casa não.
Gostava de dizer que sou uma pessoa corajosa e sem medo de nada, mas a verdade é que ao segundo dia, a ideia de deixar o hospital aterrorizava-me, e mentiria se dissesse que não me passou pela cabeça a hipótese de pedir mais uns dias de internamento. Mas fomos para casa. E não foi fácil. Tem melhorado, mas não foi o mar de rosas que eu esperava. Se calhar se tivesse tido a criança num hospital pior, com menos condições ou com um mau atendimento a coisa teria sido diferente. Mas não tive, não tenho razão de queixa do hospital, acho que correu tudo muito bem, mesmo as coisas que poderiam ter corrido mal. E a partir daqui é connosco, desejem-nos boa sorte!